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“Joga pro alto e reza!”: a história da Hail Mary


Se você acompanha a liga há algum tempo com certeza já viu ou ouviu falar sobre a tal da Hail Mary, mas o fã mais recente também já teve a oportunidade de ver essa jogada aparecendo (e dando certo) nas últimas temporadas.


Uma das jogadas mais empolgantes, quase mítica, difícil de ser completada e repleta de adrenalina e tensão, mas que quando funciona será sempre lembrada por todos. Uma Hail Mary bem sucedida é o momento em que o estádio explode em comemoração, e aquilo fica eternizado (para o bem ou para o mal, no caso das torcidas adversárias).


Esse texto trará um pouco de tudo sobre a Hail Mary: qual a sua definição, quando foi a primeira jogada, quem a popularizou e algumas de suas curiosidades.


O que é uma Hail Mary?

Hail Mary é uma jogada de passe longo que visa um touchdown para ganhar ou empatar uma partida, ocorrendo no final do primeiro ou do segundo tempo (mas principalmente no segundo tempo).


Não é uma jogada tão frequente, e por depender de uma série de fatores (como posição de campo, força e precisão do passe do quarterback, a habilidade do recebedor para conseguir a recepção em meio a uma defesa contestadíssima, até mesmo um pouquinho de sorte) as chances do passe ser completo são excepcionalmente baixas (mas não impossíveis).


Por conta de toda essa dificuldade, o nome “Hail Mary” faz referência a prece católica homônima (a “Ave Maria”), como uma espécie de pedido por ajuda divina para fazer dar certo.


Importante destacar que nem todo passe longo se qualifica como Hail Mary, assim como nem toda jogada chamada para finalizar o primeiro ou segundo tempo de jogo pode ser chamada de Hail Mary.


A primeira referência: os cavaleiros irlandeses

A história da jogada começa na Notre Dame University, universidade católica localizada em Indiana. Na década de 1920 o time de futebol americano universitário de Notre Dame, chamado Fighting Irish, possuía quatro jogadores que ficaram conhecidos como “Four Horsemen” (em tradução, “Os Quatro Cavaleiros" [do Apocalipse]): Elmer Layden, Jim Crowley, Don Miller e Harry Stuhldreher.


Crowley contou a seguinte história em diversos discursos públicos na década de 1930: durante um jogo entre Notre Dame e Georgia Tech, em 28 de Outubro de 1922, os jogadores do Fighting Irish fizeram preces de Ave Maria juntos antes de marcar os touchdowns da partida (Notre Dame venceu o jogo por 13-3). Segundo Crowley, a sugestão da reza partiu do linemen Noble Kizer (que era presbiteriano), logo antes do primeiro touchdown da partida, que ocorreu em uma situação de quarta descida para o touchdown. Após o jogo Kizer teria dito a Crowley “Diga, essa Hail Mary [Ave Maria] é a melhor jogada que nós temos.”.


Em 2 de Novembro de 1935, Ohio State e Notre Dame se enfrentavam no que ficaria conhecido posteriormente como “Game of the Century” (“Jogo do Século”); restavam 32 segundos para o final da partida quando o half-back Bill Shapeskeare encontrou o recebedor Wayne Millner para o touchdown da vitória de 19 jardas. O Head Coach de Notre Dame era Elmer Layden, que havia jogado em 1922 naquele jogo contra Georgia Tech e participado das preces, disse após a vitória que aquela jogada era uma “’Hail Mary’ play”.


“Hail Flutie”

Ainda no ambiente universitário (mas a essa altura a jogada já havia chegado à NFL) ocorreu uma Hail Mary memorável, protagonizada pelo quarterback Doug Flutie, de Boston College.


Era 23 de Novembro de 1984, Boston College e Miami (FL) estavam se enfrentando; o time da Flórida vencia por 45-41 com apenas 6 segundos restantes no relógio.


Eis que Flutie (um quarterback considerado baixinho para os padrões da posição) conseguiu completar um passe de 52 jardas para Gerard Phelan, conseguindo assim o touchdown da vitória para Boston College.


O sucesso de Flutie e Phelan contou com uma falha defensiva: a secundária de Miami estava posicionada na linha de goal, marcando os recebedores à sua frente. Phelan, que executou uma rota post, passou batido por trás deles. A defesa de Miami acreditava que o baixinho Flutie não seria capaz de lançar a bola no fundo da endzone.

No final o baixinho acabou sendo o gigante da partida, dando a vitória ao time de Boston. De quebra Flutie ainda ganhou uma estátua em comemoração a essa jogada: simulando sua posição na hora do passe, está do lado de fora do Alumni Stadium de Boston College, e foi inaugurada em 7 de Novembro de 2008.


Agora, vale observar que a “Hail Flutie” realmente se configura dentro do que hoje é reconhecido como uma Hail Mary, ou seja, um passe longo e, de certa forma, improvável de ser completo. Apesar das referências à Hail Mary de Jim Crowley e Elmer Layden de Notre Dame, nenhum dos passes havia sido longo (ambos foram de apenas 6 jardas).


1975: a Hail Mary chega à NFL

Era 28 de Dezembro de 1975. O Metropolitan Stadium (Bloomington, Minnesota) era palco do NFC Divisional Game, e Dallas Cowboys e Minnesota Vikings se enfrentavam para decidir quem passaria para a próxima rodada dos playoffs.


Restavam 24 segundos para o final do jogo, os Vikings ganhavam por 14-10, e os Cowboys tinham a posse de bola aproximadamente na metade do campo; as chances de vitória do time pareciam improváveis.


O Head Coach de Dallas, Tom Landry, chamou para a próxima jogada um passe longo. O quarterback dos Cowboys era Roger Staubach, que já utilizava o termo “Hail Mary” desde a sua época no College. Em 1963, quando ainda estava na universidade, jogando pela U.S. Naval Academy contra Michigan, Staubach descreveu um passe seu para touchdown como uma “jogada de Hail Mary”.


Pois bem, naquele jogo contra os Vikings, Staubach lançou a bola (um passe depois contabilizado para 50 jardas) o mais alto e longe possível, logo em seguida rezando uma Ave Maria, pedindo por um resultado favorável. Suas preces foram atendidas.


O passe de Staubach, apesar de longo, na verdade foi uma underthrow (quando o quarterback lança uma bola em que o recebedor precisa voltar para recebe-la, pois o passe foi curto); o wide receiver Drew Pearson, que corria na direção da endzone, precisou ajustar sua rota para tentar a recepção.


Perto de Pearson estavam o cornerback Nate Wright e o safety Paul Krause, dos Vikings. Quando Wright tentou se dirigir para pegar a bola Pearson colidiu com ele. Enquanto o cornerback caia, o que levou Krause a gritar com os árbitros para chamarem uma jogada de interferência de passe de Pearson sobre Wright, o wide receiver dos Cowboys estava fazendo a recepção. A colisão quase derrubou a bola, porém ele conseguiu prende-la entre seu braço e sua coxa, depois bastou “guarda-la” e correr o pouco que faltava para a endzone e marcar o touchdown da vitória.


Na entrevista pós-jogo Staubach confirmou:


“Foi um passe de Hail Mary. Eu só joguei [a bola] para o alto o mais longe que consegui.”

Ao final do jogo Pearson disse em entrevista que as chances de uma jogada como aquela dar certo eram mínimas. Concordando com seus jogadores, Landry acrescentou:


“Nossa única esperança era lançar e torcer por um milagre.”

O "milagre" foi concedido e a vitória foi de Dallas. Após esse jogo a jogada Hail Mary passou a fazer parte do vocabulário e do imaginário do futebol americano profissional, deixando de ser restrita ao ambiente universitário.


Fatos e curiosidades sobre a Hail Mary na NFL


De acordo com a ESPN apenas 9,7% das tentativas de Hail Mary resultam em passes completos. Entre 1975 (com a Hail Mary de Staubach e Pearson) e 2021 foram somente 34 tentativas dessa jogada que foram bem sucedidas (sendo que apenas no período entre 2010 e 2020 essa jogada foi tentada 193 vezes). Dessas 34, nem todas fizeram com o que o time que conseguiu esse êxito vencesse a partida no final.


Apenas três quarterbacks conseguiram repetir o feito mais de uma vez. O pioneiro dessa estatística foi Steve Bartkowski, do Atlanta Falcons, que conseguiu em duas ocasiões diferentes (1978 e 1983).



Andy Dalton, quando ainda jogava no Cincinnati Bengals, também conseguiu fazer uma Hail Mary bem sucedida em duas ocasiões diferentes (2013 e 2016). Em ambas a jogada foi para o wide receiver A.J. Green.

O recordista dessa estatística é Aaron Rodgers, do Green Bay Packers. Rodgers já foi apelidado de “Hail Mary King” ("Rei da Hail Mary") porque é o quarterback que mais conseguiu completar essa jogada: foram 3 tentativas bem sucedidas (2015, 2016 e 2017).

Rodgers já declarou que sempre pratica esse tipo de jogada:


“Você melhora nela praticando-a [...] Eu sempre fazia repetições de Hail Mary nesses anos, e eu me acostumei a lançar fora do pocket, ou encontrar um espaço para lançar dentro do pocket, e meio que me acostumei a como esse lançamento parece, em termos de altura e distância...”

Confira na tabela abaixo todas as Hail Mary bem sucedidas que ocorreram na NFL, de 1975 até a temporada passada, incluindo alguns detalhes básicos sobre essas jogadas.

Pela tabela é possível perceber que alguns times nunca tiveram uma tentativa de Hail Mary bem sucedida até agora. Outros times já conseguiram repetir o feito em mais de uma ocasião; Atlanta Falcons, Minnesota Vikings, Cleveland Browns e Green Bay Packers são os únicos times a terem 3 tentativas bem sucedidas que, de quebra, resultaram em suas vitórias.

Ainda, é possível pensar que a década de 2010 seria a “Década de Ouro” da Hail Mary, visto que foram 14 tentativas bem sucedidas.



Fotos: Reprodução ESPN, Lions Wire – USA Today, Reading Eagle, WBUR, Mapio.net, Pinterest, Atlanta Falcons, FanSided, NBC Sports, Pride of Detroit, Madison.com, USA Today

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